Não volte pra casa meu amor que aqui é triste
Não volte pro mundo onde você não existe
Mas não se esqueça de mim não
Não me lembre que o sol nasce no leste
E no oeste morre depois
O que acontece é triste demais
Pra quem não sabe viver, pra quem não sabe amar
Não volte pra casa meu amor que a casa é triste
Desde que você partiu aqui nada existe
Acabou o seu tempo, acabou o seu mar
Não volte pra casa meu amor que aqui é triste
Vá voar com o vento que só lá você existe
Não se esqueça que não sei mais nada, nada de você
Não me espere porque eu não volto logo
Não nade porque eu me afogo
Não voe porque eu caio do ar
Não sei flutuar nas nuvens como você
Dó com baixo em dó
Sol com baixo em si
Fá com baixo em fá sustenido
Já não sei amar, o que é o amor?
Só de imaginar quando você não está comigo
A música diz por si só, eu não precisaria dizer mais nada, no entanto ela me toca de uma maneira tão verdadeira que o silêncio me arrebata e preciso dar um ou mais piu's.
O que é uma separação? O término? É muito interessante pensar em como isso que acaba nos deixa sem chão, e poder experimentar a nossa fragilidade de naquele instante fracassar. Não se sabe voar, não se sabe nadar, não se sabe mais nada de si, nem do outro. O que é perder um amor e reconhecer que não se sabe perder? E que nisso mesmo, mora a nossa incapacidade de amar.
O quão paradoxal é, estar tão só (Sol, representado por essa nota) sem alguém, e poder admitir que por isso mesmo (por não suportar a solidão) que não se pode recebê-la de volta. Porque é preciso fazer algo com esses restos, com essa sobra, com esse nada que se deixou. “Aqui nada existe”. Com essa tristeza que ronda, com esse fim que insiste em se fazer presente, mas que dói e não se quer lembrar, não é tanto uma ausência, mas uma presença excessiva da pessoa amada por todos os cantos que ela não está, mas está como um fantasma.
“Não me lembre que o sol nasce no leste
O que acontece é triste demais
Pra quem não sabe viver, pra quem não sabe amar”
O quão bonito é poder reconhecer que só se sabe amar quem encara a morte, a perda, o fim e, no entanto, em certos momentos não saberemos realizar isso. Não saberemos como, nos perderemos. E que em alguns momentos não saberemos amar e nem viver, por não saber/suportar perder. A nossa maior verdade, a nossa maior fragilidade é essa: a nossa voracidade em não saber perder. E talvez é justamente no meio desse não saber, nessa perda, de reconhecer em si essa falta de sustentar a liberdade do voo nas nuvens, que podemos libertar o outro e arrumar a nossa própria casa. Por enquanto essa casa não está aberta para visitas...
O Sol morre…o amor demanda um luto da paixão, um luto dos ideais de si e do outro, daquilo que não suportamos, não damos conta, de encontrar nossa face mais infantil. E ao fazer esse luto de si, reconhecer o insuportável que é separar-se do outro e por isso mesmo separar, talvez se possa amar. Porque é também parte do amor perder o próprio amar, este que busca sempre um regenerar-se “Já não sei amar, o que é o amor?” “Inclusive o amor é a desilusão do que se pensava que era o amor” Clarice Lispector
Eu não sei de música para dizer exatamente, mas essa parte em que ele canta somente notas musicais me remete a algo indescritível, algo que é da ordem do incapaz de se dizer, apenas sentir, apenas atravessar essa Solidão própria de quem se deixou atravessar pelo encontro de um amor. Ele sente então essa necessidade de deixar livre, é preciso que não volte, para que ele possa refazer sua própria liberdade, porque já não sobrou nem mesmo as palavras, e o que sobra disso é a angústia, é preciso refazer caminhos para o desejo. É preciso resgatar a fala, só assim podemos nos dirigir ao outro, é escrevendo cartas que se ama, é pedindo e convidando que se deseja.
Poupar o outro de nosso próprio desamparo sem (ao mesmo tempo) impedi-lo de aparecer, é essa tarefa árdua de que se trata o amor. Porque somente desamparados podemos tirar alguém para voar nas nuvens, mas somente na dose em que caiba também o desamparo e o convite do outro. E por vezes, esse convite não vem.