Pesquisar

Filme Inimiga Perfeita: Sindrome de Estocolmo em Paris, a idealização e a morte

 Essa terceira e última parte contém spoilers.   



Angust é um arquiteto muito famoso, bem sucedido, escreveu um livro e está até fazendo conferências, palestras com um discurso bonito, onde criou hospitais pensando no bem estar das mulheres e gestantes (o que não é por acaso). Essa imagem dele esconde ao mesmo tempo que indica/revela sua verdadeira história.  

Isabelle aparece mais adiante, essa que seria Gradiva que falei na parte 1, e ela parece ser o ponto de encontro entre ele e Texel. Texel conta a história de como ela se apaixonou por essa mulher, uma paixão doentia, obcecada e criminosa. Após anos, Isabelle deixa ela entrar em sua casa sem se recordar de quem era ela, e ao dizer que se sente com Síndrome de Estocolmo em Paris, ela revela a própria situação em que se meteu com Texel, que ri ao escutar essa frase. É uma afirmação interessante, como uma piada com as cidades Estocolmo e Paris, e também um certo absurdo, como alguém estaria com Síndrome de Estocolmo na cidade mais romântica do mundo? A personagem chega a dizer que tenta se convencer que gosta sim da cidade, mas sabe que é mentira.

Ela de fato está descrevendo um relacionamento abusivo, há algo que prende a pessoa ali, e esse algo é a idealização, a fantasia. Um certo flerte com a morte que a beleza traz, nós mulheres somos constituídas em uma feminilidade que cultua a beleza, mas que por dentro é um sacrifício, um masoquismo, somos acostumados a nos sacrificar, a sentir dor para servir de objeto, para servir esse ideal do amor. Ela não está descrevendo somente a cidade, mas o homem com quem ela está.  

E a gente entende com o desenrolar, que Isabelle é a mulher perdida de Angust, essa que ele diz que fugiu. E que as histórias assustadoras e perversas de Texel dizem a respeito dele. É muito interessante como o próprio filme nos coloca em uma certa Síndrome de Estocolmo. Constrói ele como vítima, como esse cara do bem, inteligente que sofre por um amor perdido, e de repente somos golpeadas por sua verdade. E Gradiva se revela, pois ele foi responsável por sua morte e soterramento. Uma imagem forte e que simboliza tantas mulheres que são vítimas de abusos e feminicídios, onde são caladas também pela justiça, esquecidas e soterradas, enquanto o homem segue ileso e com sua vida bem sucedida.

É muito significativo a frase principal do arquiteto ser: “A perfeição não é alcançada quando não há mais nada a ser incluído, mas quando não há mais nada a ser retirado”, ainda que essa frase pudesse ser bem interessante para pensarmos a arte e a psicanálise, dentro desse contexto revela uma outra coisa. Esse é o jogo dele e dos homens manipuladores, se utilizam de discursos interessantes para seduzir, mas são discursos vazios. E se pensarmos nessa perfeição que retira, pensamos nos crimes que ele cometeu, porque de fato foi isso que ele foi fazendo com Isabelle, foi retirando sua vida pouco a pouco para ela caber nos seus ideais e fantasias masculinas. Com sua agressividade, abusos sexuais e ataques de ciúmes, ele acaba por retirar a autoestima dessa mulher, afastando-a das pessoas, de seu trabalho, deixando-a sozinha e dependente dele. Ele segue até as últimas consequências: tirando não só sua vida, mas junto aquela que ela carregava em seu ventre. É isso que um relacionamento abusivo e a sociedade faz com as mulheres: tiram o seu poder de criação.  



Parte 1

Parte 2

 













Nenhum comentário:

Postar um comentário

E ai? O que você sentiu ou pensou?