Pesquisar

Para o meu Ratinho de LaboratĂłrio

x 

   

    Seu jeito de viver e sua histĂłria sempre foram muito intrigantes e atĂ© mesmo angustiantes para mim. Perguntava-me sempre como alguĂ©m poderia ter namorado tanto, diversas garotas desde tĂŁo novo, se dizia "vivido". NĂŁo era possĂ­vel que vocĂȘ conseguia achar o amor assim tĂŁo fĂĄcil e ficar trocando ele de mĂŁo em mĂŁo, e volta com a outra mĂŁo, agora essa, e uma salada de sentimentos. Ao mesmo tempo vocĂȘ era o senhor sem sentimentos, que sĂł queria curtir, mas que nĂŁo podia ficar sozinho. Por muito tempo acreditei nessa versĂŁo de que vocĂȘ simplesmente nunca havia amado nenhuma delas, nunca havia se apaixonado de verdade, nunca havia sentido nada e que todos os seus relacionamentos eram vazios, carnais, status. Por muito tempo essa ideia me satisfez de certa forma, mas sempre tive uma pulga atrĂĄs da orelha porque eu via que vocĂȘ sentia algo, eu via que vocĂȘ nĂŁo era quem se mostrava ser, vocĂȘ tambĂ©m sabia disso, sĂł escondia e dava a si mesmo a desculpa que nĂŁo sabia lidar com sentimentos e pronto, deixava eles de lado.  

  Hoje, vejo que sim, vocĂȘ achou sentimentos em vĂĄrios corpos, que vocĂȘ realmente experimentou diversas emoçÔes, que vocĂȘ era vivido realmente, mas hoje tambĂ©m nĂŁo acho que isso tenha sido sorte. No meio de tanta vivĂȘncia vocĂȘ nunca parou para crescer e se observar. Uma vez li "felicidade nĂŁo Ă© quantidade", Ă© verdade, a felicidade estĂĄ na qualidade, e parece que vocĂȘ sempre esteve mais preocupado com o nĂșmero, mais preocupado com o futuro, com o fato de nĂŁo se apegar, nĂŁo se entregar para nĂŁo se dar mal no final, vocĂȘ sempre terminava antes mesmo de começar, ferrava o outro antes mesmo de ele te ferrar, sempre na defensiva e nunca se permitindo de fato entrar de cabeça. Talvez, por medo do novo e para se convencer de que nĂŁo dava para ser de outro jeito, vocĂȘ sĂł se relacionasse com parceiras tĂŁo parecidas com vocĂȘ, e vocĂȘ se tornava cada vez mais parecido com elas tambĂ©m. Pega, mas nĂŁo se apega. Talvez para nĂŁo ter que se deparar com uma nova possibilidade de ser, vocĂȘ sĂł fizesse amizade com homens iguais e com o mesmo pensamento que vocĂȘ.  

   Apesar de eu admitir, hoje, que seus relacionamentos nĂŁo eram tĂŁo superficiais assim, tambĂ©m nĂŁo acho que vocĂȘ tenha encontrado o amor repetidas vezes. AtĂ© porque amor nĂŁo se encontra, se constrĂłi. E no meio de tantas mulheres, teve pouco tempo para focar e investir em um possĂ­vel amor em cada relacionamento que teve. Hoje, vejo seus relacionamentos como vĂĄlvula de escape. VocĂȘ procurava incessantemente estar vivenciando diversas emoçÔes para tapar um vazio dentro de vocĂȘ, e essa pose de "sem sentimentos" era vocĂȘ querendo enganar sua prĂłpria busca pelo amor. VocĂȘ buscava amor em todos os corpos, em todas as emoçÔes, algo que te provasse que vocĂȘ estava vivo. E ser desejado, amado parecia ser o Ășnico jeito de encontrar sua existĂȘncia. CarĂȘncia. VocĂȘ era carente de sentimento e transbordado por emoçÔes. VocĂȘ preferia viajar do que estar em sua prĂłpria realidade, nĂŁo era nem vĂ­cio quĂ­mico, era psicolĂłgico. Uma busca incessante por adrenalina, festas, estrada, carro em alta velocidade, acidentes, aventuras. A todo momento testando seus limites, saindo da sua prĂłpria realidade. É que vocĂȘ queria se provar que estava vivo, e em um paradoxo, se colocava em situaçÔes que punham ela em risco, Ă© que vocĂȘ queria ter a certeza de que estava vivo em outra realidade.    VocĂȘ tinha uma sede pelo controle por conta do medo de perder, o medo de ficar sozinho. VocĂȘ buscou tanto que criou um ciclo vicioso, atĂ© mesmo quando nĂŁo queria, lĂĄ estava vocĂȘ, de novo, em um relacionamento em que te dissesse que vocĂȘ nĂŁo estava sozinho, e tĂĄ bom, vocĂȘ atĂ© gostava delas, vocĂȘ se apegava, podia atĂ© se apaixonar, mas nĂŁo se desprendia de outras e de seu ciclo. Seu ego precisava ser alimentado o tempo inteiro. E por isso seus relacionamentos continuavam sendo superficiais no final das contas. Continuavam porque eram todos a respeito do seu ego, do seu vazio, da sua falta, da sua sede de amar e ser amado, mas principalmente dos seus medos nunca enfrentados. E vocĂȘ via que com esse seu jeito vocĂȘ deixava escapar relacionamentos que pudessem ter o amor que buscava e aquilo te machucava, vocĂȘ se culpava. Mas vocĂȘ nĂŁo mudava. NinguĂ©m te ensinou o que era amar e obviamente vocĂȘ foi se cansando dessa vida acompanhada mas solitĂĄria, vocĂȘ nunca se amou, sĂł se frustrava.  

   E quando vocĂȘ se viu com ela,  alguĂ©m que te conhecia por inteiro, que te fazia se amar e te mostrava o que era amor, uma pessoa que nĂŁo queria sĂł te ter, uma pessoa que nĂŁo somente estava apaixonada por sua beleza e seu papo bom, mas que queria te fazer crescer, que te amava, vocĂȘ teve medo. Quando vocĂȘ encontrou o que buscou, vocĂȘ desperdiçou. VocĂȘ estava saturado de falsas impressĂ”es, falsas sensaçÔes e emoçÔes forçadas. Estava saturado de achar que era amor e perder, saturado de se machucar, saturado de sentir. AlguĂ©m que tanto negava os prĂłprios sentimentos, mas que estava sempre em busca deles sem nem perceber. Espero que agora vocĂȘ consiga se dar uma pausa. Espero que vocĂȘ fique sozinho por um tempo. Que vocĂȘ mergulhe no seu interior e se encontre. Que vocĂȘ se aceite. Que vocĂȘ mude e se transforme. Que vocĂȘ se presenteie com o melhor que vocĂȘ pode: o amor prĂłprio e terapia. Que vocĂȘ veja o que vocĂȘ tanto busca, mas que vocĂȘ nĂŁo perceba que vocĂȘ teve o que buscou e jogou fora. Ou que perceba, mas se perdoe, que nĂŁo se culpe e entenda que aquela nĂŁo era a sua hora, ou que talvez nĂŁo tenha hora, mas hĂĄ coragem. E que encontre uma nova hora de ter coragem da forma mais linda e surpreendedora, e se for possĂ­vel, nĂŁo deixe escapar. 

A Sereia que nĂŁo estava lĂĄ


 

O que Ă© o que Ă©? 
Tem calda, mas nĂŁo tem pĂ© 
É peixe, mas nĂŁo Ă© 
Vive no reino do mar
Mas ela morre de curiosidade de sair de lĂĄ 
Ops, jĂĄ disse que Ă© ela.
Ela que Ă© bela 
Canta na pedra 
Para enfeitiçar.
Penteia seus longos cabelos 
Para me conquistar 
Me pisca um olho 
Para me apaixonar 
Um dia prometi lhe dar tudo que sonhava 
Levei ouro 
Levei prata 
Levei espelho 
Levei brincos e colares 
Levei tudo que possa desejar 
Decepção. 
Ficava triste, mas logo voltava a cantar
Sentia que queria me enganar
Um dia, levei uma caixinha de mĂșsica 
Um casal dançava dentro dela 
Ela olhou, olhou 
NĂŁo parava de olhar 
Uma lĂĄgrima escorreu 
E saltou para o mar.
Foi quando entendi que ela sĂł queria alguĂ©m para amar 
Pois entĂŁo, eu ia todo dia voltar
Para seu amor reconquistar,
E todo dia eu encontrava 
A sereia que nĂŁo estava mais lĂĄ. 
- Luisa Monte Real 

1/3 de Partir

 
  Dica: MĂșsica "Training Wheels", Melanie Martinez 

    Um dia acordei e vocĂȘ estava estranho. Tudo bem, a gente tinha tido uma briga, muito idiota por sinal. Eu continuava com muitas coisas a te dizer entaladas em meu peito. É que a gente sempre foi muito sincero, e meus desabafos sempre te pertenceram. NĂŁo sabia se dessa vez eu deveria guardar para mim porque pela primeira vez nĂŁo sabia como vocĂȘ reagiria e lidaria com a bomba que eu iria lançar. Mas vocĂȘ me conhece, eu sempre escolho a sinceridade e a transparĂȘncia. VocĂȘ logo percebeu que eu estava entalada e me ligou, se importou. Eu disse tudo, mas vocĂȘ disse que nĂŁo ia falar mais nada, como da Ășltima vez que tĂ­nhamos brigado. Tenho certeza que vocĂȘ tinha o que dizer, mas aposto que seu orgulho de manter sua promessa consigo mesmo te fechou, nĂŁo Ă©?! VocĂȘ preferiu guardar tudo para si bem, bem lĂĄ dentro fingindo que nĂŁo tinha nada. Fingindo que nĂŁo te afetava. E fez isso porque te afetou demais, nĂŁo Ă©?! Mas eu te estendi a mĂŁo, a gente sempre foi o apoio um do outro, desabafei colocando soluçÔes para nĂłs dois. 
    Seria tĂŁo mais fĂĄcil se vocĂȘ cedesse, se vocĂȘ se permitisse, mas vocĂȘ estava com tanto medo de se entregar, tanto medo de se machucar... lidar com vocĂȘ era exatamente como “Training Wheels” de Melanie Martinez. Acredito que tudo que lhe disse de alguma maneira fez vocĂȘ voltar as vĂĄrias casas de nosso pequeno joguinho que gosto de chamar de nossa vida juntos. Achei que com o tempo afastado de mim, a saudade te curaria, sua confiança em mim voltaria e sua pecinha do jogo se encontraria na mesma fase que a minha outra vez. Mas eu nĂŁo sei, vocĂȘ nĂŁo se afastava, vocĂȘ vinha. Mas eu nĂŁo queria vocĂȘ, vocĂȘ vinha me machucar, nĂŁo por querer, mas sua barreira me impedia de me conectar com vocĂȘ e eu me sentia cada vez mais jogando o jogo sozinha. É talvez eu chegasse no final e vencesse, mas eu nĂŁo queria se nĂŁo fosse com vocĂȘ. Eu te perguntava o que era e vocĂȘ dizia que eu era louca, que era coisa da minha cabeça, que eu tava viajando... ai, isso me deixava com uma raiva tremenda!
    Cheguei a pensar que vocĂȘ mudou comigo porque estava namorando, mas vocĂȘ jĂĄ namorou mil vezes antes e isso nunca havia acontecido... ai, vocĂȘ me deixava tĂŁo insegura e eu continuei desabafando com vocĂȘ sobre tudo o que eu estava sentindo, afinal vocĂȘ me perguntava e se preocupava, mas na hora de resolver nĂŁo conseguia se entregar. Gostaria tanto de massagear a sua dor. Um dia desses vocĂȘ me chamou para sair, mas era tĂŁo tarde... se eu jĂĄ fosse independente eu ia na hora e tenho certeza que minha presença faria um reencontro de nossas peças e atĂ© irĂ­amos passar de fase, mas eu nĂŁo fui... era loucura demais, e em partes eu errei em nĂŁo ir. Em outras partes vocĂȘ fez de propĂłsito, sabia que eu nĂŁo poderia, e usaria como desculpa de que estava tentando sim. Eu te conheço tĂŁo bem e vocĂȘ ainda assim achava que conseguia fingir suas atitudes. Talvez estivesse tentando fingir para si mesmo. Houve um dia em que vocĂȘ havia bebido um pouco e foi o Ășnico dia em que vocĂȘ foi vocĂȘ comigo e eu fiquei feliz, porque eu soube que ainda existia o meu velho amigo ali. Eu sĂł sei que eu estava confusa, perdida, com raiva. NĂŁo me arrependera de tudo que falei, falei para que fosse consertado, quem estava estragando as coisas era vocĂȘ, aliĂĄs, vocĂȘ nĂŁo, porque vocĂȘ nĂŁo estava sendo vocĂȘ.
    Seu ego, seu orgulho, seus medos estavam me empurrando. Eu procurava aguentar porque vocĂȘ sĂł fazia isso para me rejeitar antes de ser rejeitado. Eu precisava provar que eu nĂŁo ia te rejeitar, precisava te provar que as coisas podiam ser diferentes. Eu consumia uma força que eu nĂŁo tinha. Eu aguentava os seus erros nas minhas costas e agora de boca fechada, e vocĂȘ percebia. Como vocĂȘ pensou que se fechar ia fazer dar certo, hein?! Mesmo se eu chegava de mansinho com carinho vocĂȘ nĂŁo amolecia, qual Ă© a sua, hein?! VocĂȘ nem percebia, vocĂȘ estava dolorido?! VocĂȘ dizia que eu era dramĂĄtica para nĂŁo aceitar que doĂ­a, nĂ©?! Eu nĂŁo sei, eu nĂŁo sei, por favor, hein?! Me responde, me dĂȘ um sinal! NĂŁo me sufoca! Queria te entender, vocĂȘ nĂŁo queria me machucar e ao mesmo tempo me machucava para nĂŁo se machucar, ou vocĂȘ mudou por estar namorando?! Eu estou louca?! NĂŁo! Eu nĂŁo sei, eu nĂŁo sei, eu acho que nĂŁo. Eu nĂŁo ia aguentar, eu ia cansar, vocĂȘ estava se estragando, estragando tudo e eu me estragava junto, por nĂłs.
(Continuação Aqui)

 - LuĂ­sa Monte Real 

   

Meu PĂ© de Cerejas


    A gente correu para o mato onde tinha uma casinha na ĂĄrvore que eu queria lhe mostrar.
---Vai, pode abrir os olhos... – esperei alguns segundos suficientes para que a vista se acostumasse - gostou?!
    NinguĂ©m podia enxergar a gente ali. Era o nosso lugar. Nosso esconderijo. EstĂĄvamos sentados e sem querer uma manga de minha blusa caiu e meu ombro ficou Ă  mostra. Eu rapidamente vesti para que vocĂȘ nĂŁo visse. Mas vocĂȘ viu, Ă© claro...
---Ei, espere aĂ­... - vocĂȘ se aproximava e com suas mĂŁos delicadamente tirava a manga - O que Ă© essa marca?
---NĂŁo Ă© nada.
   Te olhei nos olhos e vocĂȘ olhava minha marca vermelha com um formato de ameba. NĂŁo gostava muito dela, mas era minha. Depois dali vocĂȘ começou a querer desvendar minhas marcas atĂ© que despertasse um desejo recĂ­proco e eu pudesse ver as suas tambĂ©m. VocĂȘ foi duro demais comigo, Ă s vezes era rĂ­gido, nĂŁo queria me contar de jeito nenhum, nĂŁo se abria de jeito nenhum. Mas eu queria tanto... vocĂȘ.
    Mas ali naquela casinha a gente montava um mundo de marcas sĂł nosso. Eu pegava algumas de suas marcas para mim e vice-versa. A gente se transformava, eu te mudava. VocĂȘ queria beijar cada marca, queria cuidar de cada cicatriz. Às vezes eu chorava e vocĂȘ limpava. VocĂȘ sempre foi o garoto que roubava coraçÔes e dessa vez vocĂȘ quis me dar o seu para que o meu nĂŁo ficasse tĂŁo sozinho.
   VocĂȘ queria que a sua casa fosse meu peito para que vocĂȘ pudesse construir um jardim onde meu sorriso fosse a porta de entrada para o seu. VocĂȘ queria cuidar do telhado da nossa casinha para que de noite nĂŁo chovesse na gente e eu pudesse dormir bem o bastante para te abraçar e te acolher.
   VocĂȘ queria fechar as janelas para que meu cheiro ficasse na coberta ainda de manhĂŁ quando acordasse e tivesse me perdido pela cama.
   VocĂȘ queria que eu te mantivesse acordado atĂ© a madrugada para ter a certeza de te desejar atĂ© o dia seguinte.
    Porque a casinha era tĂŁo nossa, e a gente era tĂŁo bom, vocĂȘ nĂŁo podia deixar desmoronar. NĂŁo podia. Eu merecia. VocĂȘ merecia. A gente. E para fazer tudo isso entĂŁo, vocĂȘ sĂł tinha uma saĂ­da.
     A mudança.
     E entĂŁo, vocĂȘ passou uma semana do lado de fora plantando alguma coisa que eu nĂŁo fazia ideia do que era. Às vezes eu achava que vocĂȘ estava se arrumando para ir embora, parecia cansado, vocĂȘ nĂŁo subia mais.
    VocĂȘ mexia na terra, regava e esperava. Em alguns dias eu via que nascia uma plantinha dali e foi quando eu mais tive medo de vocĂȘ me largar com ela ali. Mas vocĂȘ fez o contrĂĄrio, vocĂȘ subiu. Foi quando sentiu essa necessidade tĂŁo grande de fazer diferente, foi quando mudou que descobriu o que era amor.
   VocĂȘ mudou seu olhar sobre tudo para que meus olhos encontrassem os seus. VocĂȘ mudou sua fala, sua voz para que eu pudesse deitar meus ouvidos e sĂł querer te ouvir. VocĂȘ se tornou carinhoso para que eu pudesse correr para os seus braços. VocĂȘ comprou lĂĄpis e papel para que eu te escrevesse e vocĂȘ me desenhasse. VocĂȘ trouxe coberta, e primeiros socorros. É que na verdade, boa parte do que estava construĂ­do, eu Ă© quem tinha realizado e te dado, meu corpo, minha alma, minhas marcas e a casinha jĂĄ estavam prontas para te receber, e vocĂȘ sabia que o toque final era seu, era entrar e beijar todos os dias, as seis marcas (pelo que vocĂȘ contou) e uma cicatriz que eu tinha no corpo. Era renovar a certeza de que nossa casinha era cada dia mais nossa. Era me dar um beijo de bom dia para eu saber que jĂĄ tinha feito o cafĂ© com o seu gostinho na boca. Era ficar doente e vir correndo assoar o nariz nojento na minha blusa, implorando para ser mimado. Eca. E eu?! Eu descobri o que era amor quando tive a certeza de que podia amar marcas tĂŁo diferentes das minhas, e de que podia construir uma casinha gostosa um pouco torta, mas que fizesse vocĂȘ se sentir confiante, leve e cuidado o suficiente para poder vir e ajeitar com toda sua engenharia de amar. Era descer todos os dias para ver o que a plantinha tinha a nos oferecer e a gente a ela. 
----Qual planta Ă© essa?
----É surpresa. Mas calma, Ă© sua.
A plantinha foi crescendo e se tornando ĂĄrvore, cresciam flores rosas lindas, eu sabia qual era, mas nĂŁo lembrava, que droga! Era tĂŁo linda, e ele tinha feito para mim. Eu nĂŁo acredito que ele havia plantado uma ĂĄrvore e de certa forma aquilo crescia dentro de mim dia apĂłs dia, me fazia brilhar por dentro. AtĂ© um dia em que descemos e eu vi uma coisinha pendurada na ĂĄrvore redonda, avermelhada para o roxo.
Era uma cerejeira.
---VocĂȘ Ă© doce sem ser enjoativa, linda, pequena, gostosa, sensual e companheira. Pacote completo. – ele disse, apesar de eu nunca ter sido tĂŁo segura quanto a isso.

   E agora, toda vez que ele tem que ir por alguma razĂŁo, as cerejas brotam para que eu nĂŁo fique sĂł, e me lembre de comĂȘ-las ao lado de minhas escritas manchando e dando o toque final com a cor que ele me floresceu. - LuĂ­sa Monte Real 

A Arte de Ser VocĂȘ


E eu peguei uma cesta com barro
Comecei a montar o que viesse na cabeça.
E o que Ă© que tem nela?
Cabelo
PĂł
Terra
Semente
E cor
Cabelo pra enfeitar
PĂł pra lembrar
Terra pra plantar
Semente pra florescer
E cor para pintar.
Numa brincadeira de mĂŁo a mĂŁo
Tinha um ritmo que de piĂŁo
Uma grande confusĂŁo
Se fazia para frente para trĂĄs,
roda a roda,
Chora, chora
gira e gira e girassol.
Redemoinho no cabelo
Os olhos castanhos
E os lĂĄbios vermelhos
Um beijo no nariz
É o que condiz
Com a paixĂŁo de um aprendiz.
As orelhas bem abertas
Ouve-se no barro o som das cores amarelas
Mas gostava mesmo na aquarela 
O rosa pink
Piquenique com as estrelas e o luar
Aonde amar Ă©
Cair na onda do mar
Na mĂșsica tocar
O barro criar
Na arte borrar
O texto postar
No teu colo deitar
Em um Sol nascer
A luta de vencer
O esforço de ser e crescer
Em vocĂȘ.

-LuĂ­sa Monte Real

A Arte De Ser Mulher



Hoje uma dor cresce em meu peito
Dor que sempre existiu
Passarinho engoliu
E agora quer voar.
Cores Sabores Dores
Escolhi a arte para me vingar
Hoje nĂŁo quero paz
Hoje eu quero falar
Hoje eu quero andar
Na rua despida
Alma Mente Corpo
Quero andar em meio a chuva
Cai aqui no meu colo
LOUCA TPM
Sangro impura
enquanto ando, formando um cheiro
E que meu cheiro me fortaleça
Em suas narinas cresça
E vocĂȘ sinta o meu suor.
Com a arte, ando em cĂąmera lenta como em um clipe
Numa ilusĂŁo de me despertar e me libertar
Com a arte me ensino a ser,
a transparecer, a doer, a mexer, a envolver.
Em um grito sento no asfalto
Carrego meu filho no colo
Onde fui me perder?
Se ao menos eu soubesse diferenciar o que quero ser do que querem que eu seja
Se ao menos eu soubesse o que Ă© ser mulher
O que Ă© ser um ser desvinculado de vocĂȘ
Homem
Me usa Me bate Me taxa Me mede Me rotula Me usa Me abusa Me esconde
Me sussurra, Me leva prum canto, pergunta se eu aguento.
E se nĂŁo aguentar?
Me embebeda, me convence, me fala de direitos iguais
Me deixa no chĂŁo, nĂŁo olha no meu olho
Me usa Me bate Me molda
Diz que sou sua mulher e mulher sua Ă© de tal jeito, tal medida
É santa É puta Ă‰ pura
Luz branca que me come
me apaga me faz limpa me faz santa
Branca
Do véu ao vestido
RomĂąntica Virgem Rosinha
Endireitou o cara de balada
Pelas costas, baleada
Traição
Na cama, mulher casada finge orgasmo
Sexo?! Nunca segurou homem nenhum
Amor também não...
VocĂȘ jĂĄ foi amada?
Precisa ter amor prĂłprio, hein
Para que tanto amor prĂłprio se no final, odeiam e rasgam minha pele?
Aprenda a me amar vocĂȘ
Aprenda a me ver
Aprenda que eu quero ser muito mais
Aprenda que eu posso e eu vou
Aprenda a me aplaudir
Aprenda a subir comigo.
Desejada Desejo Culpa
Minha arte Ă© ser mulher
Mas que mulher se nunca fui o que quis?
Que mulher se quando me olham nĂŁo posso ser?
Qual a minha arte que me revela?
NĂŁo tem saĂ­da.
Qual a arte de nĂŁo ser mulher vencida?
Qual a arte de ser mulher presa na dor de ser mulher?
Qual a arte que me liberta para ser mulher que respira?
Qual a arte que me dĂĄ voz para dizer o que Ă© ser mulher?
Eu nĂŁo sei,
Eu nĂŁo sei o que Ă© ser mulher.
Nem mesmo quero deixar de ser
Eu sĂł quero ser a arte que nos faz mulher amada.

-LuĂ­sa Monte Real

Me Inundei de VocĂȘ e Odiei


    Eu te odeio. Eu te odeio porque me sinto menor sem vocĂȘ. Eu te odeio porque nĂŁo quero que faça sentido nĂŁo ter vocĂȘ. Eu te odeio porque me sinto impotente. Eu te odeio porque permiti me inundar com seu vazio. Eu te odeio porque mesmo encontrando o nada, eu construi alguma coisa. Eu te odeio porque te carreguei. Eu te odeio porque acredito que a gente escolhe como lidar com a situação e tem dias que eu sĂł sei doer. Eu te odeio porque eu estou cansada. Eu te odeio porque a cada dois passos que eu dou para frente, eu volto um atrĂĄs. Eu te odeio porque sinto sua falta. Sinto falta de todos os milhares de filmes e sĂ©ries que a gente via juntos, e por que raios isso era tĂŁo especial pra mim? Sinto falta de compartilhar minha vida com vocĂȘ. Falar toda hora sobre nada e tudo. Te encher o saco e me sentir amada, acolhida. Eu te odeio porque sinto falta de todas essas coisas, mas nĂŁo acho que vocĂȘ mereça. NĂŁo mais. NĂŁo hoje. NĂŁo depois da forma que me atacou com uma flecha bem na ferida me fazendo cair de uma forma que nem lembrava se caia de baixo ou de cima. NĂŁo depois de enxergar que vocĂȘ nĂŁo tem mais nada a me acrescentar alĂ©m de dor de cabeça. E eu entro em surto. Porque sinto sua falta, mas se penso em vocĂȘ aqui, comigo agora, sĂł consigo imaginar uma coisa: discussĂŁo, decepção, cansaço da sua imaturidade, do seu vazio, da sua alma perdida. É porque na real, eu sinto falta da pessoa que vocĂȘ era antes de me perder. Mas aquela pessoa nĂŁo volta mais e eu preciso que alguĂ©m me diga isso. Aquela pessoa nĂŁo existe mais. Aquela pessoa estĂĄ por aĂ­ se perdendo e sendo escondida como vocĂȘ sempre fez consigo mesmo. É porque eu nĂŁo consigo te perdoar em como tudo estava sendo tĂŁo leve, no esforço que fiz para que fosse saudĂĄvel, e vocĂȘ teve que virar esse monstro e me engolir numa dor de ego desesperado.
       E eu odeio que eu tive nojo de vocĂȘ, eu odeio que eu tive desprezo por vocĂȘ. Eu odeio o quanto vocĂȘ foi fraco. Eu odeio o tanto de esforço que vocĂȘ fazia para provar a mim o prĂ­ncipe que vocĂȘ se tornara, como se eu tivesse que te aplaudir ou dar nota 10 depois de um ensinamento que te dei. Eu odeio que vocĂȘ falou que vai lutar por ela como eu lutei por vocĂȘ, querendo mostrar que vai acertar dessa vez, sĂł que do seu jeito, esse jeito razo bem mais ou menos, porque "queremos coisas diferentes" e vocĂȘ nĂŁo tem tempo. Eu odeio que vocĂȘ tava tĂŁo preocupado com a minha aprovação que nem ao menos percebia que vomitava dentro da minha boca um mar de podridĂŁo que descia arranhando e intoxicando tudo. Eu odeio ser seu porto seguro quando nem mais pier eu tenho. Eu odeio seu orgulho que vocĂȘ sabe, nĂŁo se sustenta comigo e vocĂȘ desaba.
     Meu amor, e vocĂȘ veio cheio de si, e vocĂȘ veio cheio de orgulho pronto para ganhar o trofĂ©u. E eu te dei uma rasteira para voltar para realidade e vocĂȘ ainda teve a coragem de desabar em mim?! Eu odeio que vocĂȘ nĂŁo se calou e nĂŁo foi embora. Odeio que vocĂȘ se despedaçou, se despiu sem que eu quisesse ver. Eu odeio que vocĂȘ provocou, nĂŁo aguentou o troco e ainda achou que tinha o direito de derramar seu sangue sobre o meu. E agora eu odeio que no meu sangue escorre o teu e eu nĂŁo sei mais identificar a dor que Ă© minha ou sua. Eu odeio que a sua dor agora queima toda vez que meu coração bombeia. E eu odeio que as coisas mais bonitas que senti foram por vocĂȘ. Odeio achar que ainda Ă© o mais bonito e com sentido em mim, enquanto parte de mim diz que para vocĂȘ nem Ă© mais e talvez nunca nem foi. E eu racionalmente, me acho tĂŁo mais merecedora, mais especial do que vocĂȘ sĂł para fingir que, na verdade, nĂŁo sinto o oposto, e que nĂŁo te coloco num encantamento. NĂŁo deveria, mas me sinto traĂ­da por mim mesma. Mas odeio mais ainda que parte de mim te entende e te respeita. Parte de mim Ă© humilde, te permite e quer ver vocĂȘ crescer, parte de mim te ama como irmĂŁ desde sempre e reconhece que te ama, mas que vocĂȘ nĂŁo Ă© merecedor de meus desejos e de minhas fantasias mais profundas, apesar de ainda sentir e me culpar friamente por isso. E eu odeio como me sinto o pĂł sem ter alguĂ©m que nem se quer faz questĂŁo de ter alguma relevĂąncia na prĂłpria vida. Mas tudo o que eu odeio Ă© porque amo. O que odeio Ă© amar essa coisa masoquista de te gostar. - LuĂ­sa Monte Real